segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

E a estratégia começa a funcionar!

Sim, as naus saíram do Teja, regozijem-se pois! (Valeu, Antonio!)

Um dos meus personagens centrais é o Pero Vaz de Caminha, aquela da carta, vocês o conhecem. Aqui, ele é apenas um aprendiz de escriba, começando a penar na corte e com seu mestre: Rui de Pina, que divide o papel de protagonista com ele, é um bocado cruel, pretensioso, arrogante. Quem disser que ele é meu alter-ego, vai ter o comentário apagado. :P

Enfim, como prometo responder os comentários em um outro post, agora deixo dois trechinhos do Pero pra vocês:

***

Pero e Nimue


A mão esguia e branca de Nimüe encostou na sua . Foi só por um momento, mas era como se facas cortassem sua alma. Pero já ouvira falar de Fata, o Destino, a deusa louca que dança aleatoriamente em um sentido que só ela desvenda. Pela primeira vez, o jovem cronista encarava os seus olhos vazios de senso, sabendo que ali não encontraria resposta, apenas sua perdição.

A voz clara da sacerdotisa cortava como um sabre, ao despedaçar a alma do jovem escriba.

- Você é um rapaz lindo, Pero. Mas você sabe que sou comprometida, desde sempre consagrada ao serviço e aos caprichos de meus deuses. Poderei ser sua amiga. Poderemos mesmo nos tornar amantes. Mas não espere que eu ame você, ou que me prenda. Não ache que vai se tornar especial. Não pensei que serei sua. Isso não irá acontecer. E principalmente, para o seu próprio bem, não se apaixone por mim. Isso poderá matá-lo.

Talvez um homem com o senso de honra imaculado de um cavaleiro reagisse a essas palavras com uma exaltação do seu próprio senso de dignidade e desse as costas. Ou um senhor mais orgulhoso teria rido da oferta, pois poderia ter qualquer mulher.

Pero não era cavaleiro nem senhor. Mal era um homem. Ainda de cabeça baixa olhou para as suas próprias mãos, pensando em si. O que era ele? Um aprendiz, um nada, um pobre coitado, filho mais novo de um nobre empobrecido de ultimo extrato. E não bastasse essa origem, ainda nascera fraco, magro demais para empunhar uma arma. Tornara-se escriba pois pensara que ali poderia estar um talento oculto. Mas não alçara lugar nenhum com essa profissão, pois não possuía as ligações sociais corretas.

Pero, para todos os efeitos, era pouco mais que nada.
E Nimüe era tudo. A futura Grã Sacerdotisa de Avalon. Escriba e trovadora, sacerdotisa e maga; a mulher mais linda e perfeita que ele jamais vira.

O que ela vira nele? Não possuía valor algum, para poder ser digno dessa atenção semi-divina. Com a íntima certeza que caminhava em direção a um abismo, mas simplesmente sem poder evitar, ele entregou-se na mão dos deuses dela, que não eram os seus, Pediu perdão ao Nazareno. Sabia que nada de bom sairia dali para ele. Seu destino estaria selado no momento em que aceitasse o que Nimüe sugeria.

Ergueu a cabeça.

- Senhora, não posso almejar nada mais do que essa sua gentil oferta. Enquanto a senhora me desejar, ficarei honrado em partilhar da sua companhia, sem nada exigir...

Quanto a parte de não se apaixonar, Pero nada respondeu.

Porque para isso, infelizmente, já era tarde.


***


Pero e a Imperatriz


Tremendo, sentindo o frio entrar nos ossos, com medo, o jovem levantou o rosto. Os olhos dela tinham uma cor estranha, terrivelmente incomum, um cinza que parecia esculpido em uma chapa de metal. A comparação com lâminas dispostas a cortar a sua garganta não fez muito para lhe acalmar. Pero passou a língua nos lábios e perguntou, a voz rasgando, depois do silêncio:

- E quem é você? É rainha do Finisterra?

Se ele tivesse como, preso do jeito que estava, o luso teria se encolhido. A mulher riu, uma risada aparentemente agradável, mas que ecoava nos ossos.

- Eu sou a Senhora do Vazio. Na minha cabeça, a coroa do que não existe. Nada tenho e por isso, dona do nada eu sou. Imperatriz do Fim da Terra. E dos sonhos. A Dama que prende as almas. A algoz que pode cortar tua garganta, Pero Vaz de Caminha. Viajaste tanto para morrer em minhas mãos?

Uma corrente pesou no pescoço do aprendiz. Rui de Pina soltou um grito abafado, quando viu Pero vergar com a solidez do metal. Mesmo com a garganta travada pelo ferro místico, conjurado pela Imperatriz, ele conseguiu responder, sorrindo para seu mestre.

- Não. Naveguei porque foi preciso.

Cada vez mais o corpo magro do escriba curvava-se. Sua dor devia ser indescritível. Rui tentava gritar, mas a magia daquela terra o impedia. Olhou ao redor, e viu Nimue e Lalaing debatendo-se. Alguém tinha que fazer alguma coisa.

- E valeu a pena, criatura vil?

- Não há o que não valha quando se quer a grandeza da alma, Senhora. Nenhuma dor é pouca para dobrar os cabos do mundo. Porque afinal, é o mar o espelho do céu.

(e feliz aniversário pra mim!)

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Como escrever um romance

First of all:

- Obrigada pelos elogios, pessoas. Eu me faço de humilde mas é porque eu preciso ser elogiada. Meu ego precisa de massagens diárias e como ando presa em casa por causa do pé...


- Mila, li 'O nome da rosa', mas não o Baudolino. Tenho mas ainda não li.


- Caro 'junker-que-eu-sei-quem-é', se você assinar com um perfil identificável e fizer uma crítica sólida, eu deixo o comentário ficar. Ou o melhor: não deixo. Não sou obrigada a aguentar anônimos rancorosos postando seu fel por aqui. Não gosta? Não leia. Nhé.


***


Bem, nos comentários da primeira postagem sugeriram que eu escrevesse de forma não linear, indo do final até o começo.


Na verdade, isso é escrever de forma linear, só invertida. O que acontece comigo, no caso de Finisterra, é justamente uma escrita não linear. A primeira coisa que escrevi foi aquele trecho que postei ontem. Depois o primeiro capítulo, então o final, o prólogo, trechos do que deve ser o 5o capítulo.


E foi aí que dei a primeira travada. Por mais que tentasse escrever qualquer trecho da história, não saia nada. Respirei fundo e tentei ir pelo caminho mais certinho, começando o segundo capítulo... Avançei algumas páginas e nada. Não consigo tirar as embarcações do Tejo.


A lógica reversa também não funcionou. Avançar do final até o começo.


Eis o ponto desde blog, tentar me focar no universo ficcional que eu criei.


Sugeriram escrever contos. Oras, se eu tivesse outras histórias para escrever, as escreveria, mas não é o caso. A história que eu quero contar é como Rui de Pina e Pero de Caminha participaram de uma expedição importante. E isso conta-se em um romance, com seus detalhes e seus caminhos. E claro, seus coadjuvantes.


Outro comentário é que me 'rendi' à atual modinha dos 'escritores revelação' de criarem blogs para ficar divulgando obras que nem sempre estão prontas ou em via de publicação. Este não é o caso em absoluto. Aqui, não vai ter descrições de personagens que parecem históricos ruins de ficha de RPG. Posso até dividir o que penso sobre as pessoas do meu livro, se for uma questão relevante.


Não vou postar capítulos inteiros. Trechos por vezes irão aparecer . O de ontem foi para apresentar a obra. Se eu tiver algum problema com um trecho em específico, sim, posso colocar.


Isso aqui é pra bater papo e receber feedback, tentar dividir um processo e desbloquear a escrita.


Não, ainda não surtiu efeito...

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Um gostinho de 'Finisterra'

(O trecho abaixo foi postado no meu blog 'Doces Pensantes' no ano passado, como um 'teaser' de Finisterra. A cena é a chegada da esquadra de Cabral nas bordas do fim do mundo. Não é definitivo, claro, nada no livro por enquanto é. Talvez o título, gosto dele. E os protagonistas, claro.

Ah, sim: tio Pessoa, me perdoe, eu não sei o que faço!

Pessoal dos comentários: respondo no post de hoje a noite.)


Finisterra – Viagem ao fim de tudo.

Um período de calma atravessa o Grande Continente. Os povos do Norte não mais ameaçam as fronteiras do Danu. A paz finalmente foi firmada entre Albion, Francia e Burgúndia. Porém, do confim ainda desconhecido do mundo, uma ameaça surge.

Os Corte-Real, eminentes navegadores a serviço do Imperador Dom Manuel, partiram em expedição ao misterioso fim do mundo guiados por um velho diário semi-esquecido. Mas não retornaram. Anos depois, uma mensagem é encontrada, trazendo um aviso dos irmãos: os habitantes de onde o mar acaba querem tomar para si as terras do Grande Continente.

Como Imperador da Ibéria Lusitânia, cabe a D. Manuel resgatar seus súditos e impedir essa terrível invasão. Para isso reúne uma imponente esquadra, composta pelos mais capazes homens dos diversos reinos.

E como todo o grande feito precisa ser lembrado, o cronista-mor do Império, Rui de Pina, é enviado nessa expedição, junto com seu assistente, Pero de Caminha. Por missão, ambos devem retratar as glórias e as aventuras dessa esquadra. Mesmo a custo de sua própria vida.

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Foi a voz de Nimue que deu o alarme.

- Comandante, uma criatura vinda de Ocidente!

Rui, assim como os outros, virou para olhar na direção indicada. Embaixador calejado, não estranhava quase nada. Na verdade, já esquecera da última vez em que algo lhe causara estranhamento. Nem mesmo as mais fantásticas maravilhas afetavam seu coração a ponto de tirar o ar do cronista. Já vira sereias, licantropos, harpias, dragões, dragonetes, cavalos alados e de chifres, entre muitas outras criaturas.

À sua frente erguia-se um ser horrendo. Como um negrume, saiu da nuvem de escuridão que tinham avistado no horizonte e aproximava-se com uma rapidez inacreditável. Não conseguia definir seus contornos. Percebeu que era de cor escura, pois a luz nele sumia como se encontrasse a noite. Seu hálito pútrido chegou até a embarcação e fez com que Rui sentisse uma forte vertigem.

O monstrengo que saíra do fim do mar voou por três vezes ao redor da nau, chiando como um morcego que habitasse algum dos Infernos em que os nazarenos mais radicais acreditavam. Quando falou, sua voz pareceu querer furar os ouvidos dos presentes, estridente e alta que era.

- Quem ousou entrar nas terras que não desvendo, meus negros tetos do fim do mundo?

Rui tremeu. O comandante Cabral respondeu, a voz serena apesar da ameaça.

- Viemos a mando do glorioso Imperador D. Manuel, filho del-Rei D. João Segundo!

A sombra pestilenta não retornou para o lugar de onde viera. Aproximou-se e rodeou a nau outras três vezes. O cronista pode perceber contornos de um corpo largo, e placas de sujeira e imundícias. E novamente, a voz incômoda ressoou.

- De quem são as velas onde me roço? De quem as quilhas que vejo e ouço? Quem vem poder o que só eu posso, que moro onde nunca ninguém me visse e escorro os medos do mar sem fundo?

A voz fraca de Pero elevou-se trêmula para se fazer ouvir sobre o barulho da respiração da besta voadora.

- Viemos a mando do glorioso Imperador D. Manuel, filho del-Rei D. João Segundo!

E o monstrengo aproximou-se mais ainda. Rui lembrou de algo, ensinado por Nimue no início dessa jornada, quando atravessaram uma grande calmaria. Pois que a sacerdotisa de Avalon havia explicado o poder tríplice em relação a tudo que era ligado à magia, e principalmente a criaturas mágicas. Antes que o monstro completasse três voltas pela terceira vez, o cronista usou sua voz, treinada em diversas embaixadas.

- Nesta nau, sou mais do que apenas eu pois sou um povo que quer o mar que é teu. Mais do que o mostrengo, que almeja minha alma e roda nas trevas do fim do mundo, obedeço a vontade de um só senhor. Assim iremos prosseguir, pois viemos a mando do glorioso Imperador D. Manuel, filho del-Rei D. João Segundo!

A escuridão fétida rugiu, um bramido pavoroso que gelou a alma de todos. Abriu suas asas de negrume e podridão, avançando em direção à pequena nau.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Mas afinal, que diabos é 'Finisterra'?

Dei-me conta (ó o português castiço) que nem todo mundo vai saber do que eu estou falando.

Assim:

Sou contista. Ruim, mequetrefe, de um quarto de tigela e um décimo de pataca. Mas contista.

Só que me veio a idéia para um romance. Um épico! Uma saga! Com dois protagonistas que geralmente seriam personagens secundários.

Aí, nasceu 'Finisterra', do meu amor pelos cronistas medievais, sempre narradores, sempre coadjuvantes, jamais protagonistas.

Em um mundo parecido com o nosso, mas diferente a beça, um Imperador organiza uma expedição a um lugar inóspito e pouquissímo conhecido para resgatar dois navegantes e um valioso diário. Reune uma comitiva com representantes de diversos lugares: cavaleiros, feiticeiras, alquimistas...

Só que quem nos conta a história são dois cronistas. O mais velho, Rui de Pina, está nessa a contragosto, pois preferia assegurar seu lugar na corte ao invés de partir em uma aventura perigosa, cheia de riscos. O mais novo, Pero Vaz de Caminha, é aprendiz do Rui de Pina e mostra-se entusiasmado com todas as novidades.

Os personagens são em parte baseados em pessoas reais, mas alterei idades, datas, lugares, títulos.

Refiz o mundo à minha imagem e semelhança. O que explica a sua incoerência interna.:)

Um blog para escrever um livro

Chega uma fase em que travamos. De todo. Em tudo.

E foi o que aconteceu comigo. Minhas leituras não andam, meus estudos pararam, minha escrita... hum, melhor nem começar por aí. Quase pensei, primeiro, em abandonar tudo. Mesmo. Tipo, largar tudo e sumir na vida? Dane-se o mundo, eu vou ser hippie e visitar um guru na Índia.

Mas isso é sooooooooooooo last season (ando usando gírias esquisitas, não liguem). Se o Ringo Star fez, não pode ser hype. Então, achei que pudesse ser uma pessoa séria, me dedicar apenas ao trabalho e ao mundo acadêmico.

Estou proibida de beber por enquanto e aturar um mundo em que só exista BN e UFF sóbria... Oh well. Não dá. MESMO.

Então decidi: ia dar um boot na minha vida literária, largar esse negócio de literatura especulativa e partir para coisas ''sérias'', realistas, maduras.

Preciso dizer que eu *não* sei fazer isso?

Conclui que a vítima da vez seria o meu *cof* romance*cof* de 'fantasia-história-alternativa-valsa-do-lusitano-pancada' que tento escrever, com o título provisório/definitivo de Finisterra: viagem ao fim de tudo. Bom título, péssimo subtítulo. Até porque, vejam bem... faz pra mais de oito meses que escrevi algo sobre os descaminhos dos dois cronistas lusos.

Mas recebi incentivos (do Tevão, meu namorado) e ameaças (de alguns leitores betas, Jacques Barcia entre eles).

Vamos então tentar resolver isso com esse blog. Como assim? Espero que desenvolvendo idéias, conversando ou mesmo me obrigando a escrever 3 vezes na semana aqui (atualizações 2as, 4as e 6as) eu consiga atravessar o Grande Oceano.

Pois foi justamente aí que eu parei. Apesar de já saber o final (sem spoilers, só digo que tio Martin me ensinou algo), não consigo partir literalmente. O primeiro capítulo - que precisa e muito ser reescrito - para com todos os personagens apresentados. A parte do segundo que escrevi termina abruptamente no porto de Lisboa, às margens do Tejo, depois que o Imperador Dom Manuel segue em comitiva até os barcos, já prontos para sair.

E agora? Porque me recuso a deixar Pedro Alvares Cabral liderar a sua esquadra em rumo ao 'cabo do fim do mundo, onde a terra acaba e o mar começa'? Porque não consigo fazer a narrativa fluir em meio a calmarias e tempestades do Oceano, primo-irmão do nosso Atlântico?

Talvez eu precise de companhia. Por isso, vou largar aqui reflexões, pedaços não reveladores, explicações e até falar sobre as minhas dificuldades para seguir nessa viagem.

Estão dispostos a me acompanhar?